sexta-feira, 6 de fevereiro de 2009

palosas

Pronto. Estou aqui. Resolvi jogar na rede o que me incomoda, assola, alegra, consola, conduz, ou, simplesmente o que sempre me reduziu a um nó na garganta.
Decidi opinar sobre o que me der nos tetos, mas, sobretudo, aquilo que me enxágua os olhos e resseca as esperanças. Espantarei aqui o que me estanca, incendeia e amansa. O que tem e o que não tem nexo.
Escreverei sobre as palas do meu dia a dia. Minhas percepções. Não sei por que ou até quando. Não sei de quando em quando ou de que formas. Só sei que ainda é começo. Garoa. Aurora. E pode ser sem rima também. Em prosas palosas, do meio ao fim.
E embora começar assuste, digo que o silêncio é um templo de sabedoria e, como o peso gorduroso desta frase, ele logo fica gritante. Deixar-me continuar amanhecendo com o silêncio calado em mim seria paloso.
Com o tempo, ficar quieto na insônia morosa das horas deixa de ser cômodo e passa a ser pala mesmo. Perecer longos anos a sós com as idéias e fetiches verbais é péssimo para as palavras. Entope as gavetas e pode entupir as veias, de tanto tédio. Ego no xadrez.
Escrever um blog para aparecer é paloso. Por achar que pode ser uma forma de economizar com analista, também. Eu bem que queria o meu plano de saúde cobrindo uma análise para mim. Pouco provável. Só me restou tentar aparecer.
E também não precisamos ir longe para concluir que a análise é uma grande bobagem, diante de milhões de outros brasileiros que não têm direito sequer a um simples atendimento na saúde. Morrer nas filas do SUS é paloso. E isso sempre sai nos noticiários varonis.
Ser paloso é ser notório, notícia, noticioso, reincidente, renitente, injusto, teimoso, irritante. É ser governo, oposição, lobista, até ser publicitário é paloso hoje em dia. Alguns não estão nem mais tão carecas de saber.
O ser paloso é um copo cheio até a boca de contradições. Uma metamorfose ambulante, repleta de dúvidas e suposições. O paloso é repetitivo. Maravilhado ou maravilhoso demais. Deve ter lá suas razões. Ser paloso é humano.
Aliás, ser paloso é não conseguir se comunicar em Salvador, por exemplo, sem dizer “lá ele” (pra quem não é baiano, o tal do “lá ele” é a defesa contra os verbos pervertidos). Eu me incluo nessa pala.
Dar um fora é ser paloso. Tomar um fora também. O alegre demais é paloso. A comédia forçada, com caras e bocas exageradas é palosa. Para mim, pessoalmente, transformar Piaba em Piada é paloso.
Uma tragédia anunciada, também. A chuva que ninguém esperava. Famílias inteiras soterradas no sul. O Brasil doendo-se e doando-se. Os donativos sendo saqueados voluntariamente. Um galpão cheio de outras roupas doadas, incendiado criminosamente. Isso tudo é paloso. E ninguém esperava também.
O Brasil é paloso. As cabeças, barrigas e cabaças vazias na sede do semi-árido já são “palas” perdidas no tempo. Desde que me entendo por gente a seca mata esperanças, bichos e a nossa igualha. É do solo infértil da seca que nascem discursos, radialistas e coronéis. Política palosa. Óbvia.
A maior prova disso está ai: a pala da transposição do São Francisco. Tenha ou não conseqüências para o meio ambiente; seja ou não para a massa ser manobrada politicamente e as boas intenções serem desviadas de curso, lá na frente, a transposição é palosa. E pior, para ontem.
O que a gente faz contra o meio ambiente é paloso. Mudar, desviar, destruir as fontes e reservas naturais, indiscriminada e impunemente é uma burrice artificial.
E ser um burro artificial, sem sentimento para alimentar as atitudes, também é ser um paloso. É atirar no pé e machucar seriamente as futuras gerações.
No Brasil, a pena ambiental não faz nem faísca diante das queimadas na Amazônia. Elas diminuíram agora em 80%, mas os números de qualquer governo sempre são questionáveis. Deve ter um over Ming ai.
Mas o pior de tudo é que, mesmo devendo no cartório, o mundo nos julga. É realmente paloso ser maldito lá fora. O governo não consegue conter brasileiros que não evoluíram e o MSF (Movimento dos Sem Florestas) invade o território nacional pelo Norte.
Bom exemplo é Roraima. A mídia põe as lentes nos crimes de pedofilia, na Raposa Serra do Sol, os índios acreditam serem donos de boa parte do território de Roraima e os estrangeiros abastados compram fazendas por lá. Só não vê quem não quer. O loteamento do Brasil é paloso.
A seca, a cheia e tudo que deriva do nosso desrespeito ambiental, pra mim é paloso. A morte do seringueiro Chico na porta de casa e da missionária Dóris, com sete tiros, são palas tristes.
A frase do homem do povo que, ao enterrar a missionária Dóris comparou-a a uma semente importante é palosa de boa. Para mim, profundamente emocionante e verdadeira.
Os mensaleiros impunes, a malandragem de eras, politicamente correta, glorificada nos morros e nos asfaltos do Brasil inteiro é uma pala da porra.
No Brasil, da classe A à classe E, o bom é ser esperto, furar fila, fazer malandragem. Aliás, como diz um samba muito bom que Zeca Pagodinho canta: “malandro é malandro e mane é mane”.
E vivendo no reino da malandragem, dos fura filas e das gerações que desaprenderam a respeitar os mais velhos - matando-os hoje a socos, ofensas e ponta pés-, o sujeito precisa ser paloso.
Ainda mais que a impunidade sempre acaba finalizando o nosso bom senso. A Lei brasileira é branda e passiva, como nós brasileiros somos. Aqui se o sujeito tem dinheiro de advogado e é réu primário vira rei.
Eu costumo respeitar as leis e os mais velhos. Se não fossem os meus pais, eu não estaria aqui. Os seus cabelos brancos são as minhas raízes. E eu acho definitivamente paloso desrespeitá-los.
Mas, mais paloso ainda é tentar entender um pouco da história do Brasil. Pelo pouco que aprendi sobre a nossa verdadeira história, a maioria de nós quase nunca brigou por nada, porque a minoria dizia estar brigando pela maioria de nós.
Uma lógica perversa e burra. É de onde vem a nossa comodidade. Por exemplo. Oficialmente, o Tiradentes é o herói da Inconfidência Mineira. Pelo menos, é o que nos ensinam ainda no primeiro grau da escola.
Quando chegamos ao segundo grau, a casa cai. Dizem que não era bem assim, que ele era coadjuvante. E que a tal da Inconfidência Mineira seriam, na verdade, confidências ideológicas.
O nosso herói do primeiro grau era um simples observador. E de tanto espiar, mineiramente, os poetas e intelectuais - iluminados pelo velho mundo-, conspirando e planejando revoluções ali, ele virou bode expiatório.
Quando a casa de Tiradentes caiu em minha cabeça, achei paloso sentir-me tão covardemente enganado.
A Lei Áurea é outra pala. Uma decisão minoritária, que deixou a maioria dos escravos acorrentada à Casa Grande e à Senzala. E assim, com a maioria de nós preterida, crescendo e reproduzindo-se desordenadamente nos grandes centros, chegamos até aqui.
Caiu a Colônia, o Império, a República e, graças à nova ordem mundial, a nossa Ditadura também caiu. A democracia foi uma luta bonita, mas uma luta mais burguesa.
Eu acredito que o povo não se engajou. No interior tinham medo dos comunistas comedores de criancinha. E isso é covardemente paloso. Nossa redemocratização seguiu os trilhos da nova ordem mundial, mas a ditadura deixou seus filhotes, métodos e cicatrizes políticas.
E enquanto países mais desenvolvidos seguem desenvolvendo sua gente, tratando-os como motores e instrumentos de seu próprio desenvolvimento, nosso povo continua sendo visto e tratado como instrumentos de reposição de mandatos e reeleições. Paloso.
É paloso ver as periferias inchando. Sentir a pobreza e a violência cada vez mais próximas de nós, em Salvador e em outras grandes capitais é paloso.
Apenas por estes motivos resolvi escrever palas na internet. Sem me estender tanto, claro. Escrever muito também é paloso, hoje em dia.

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