sexta-feira, 17 de abril de 2009

A situação chegou ao fundo do bolso

O verso desceu torto
Lapela abaixo
E parou perto
De uma lágrima.
Chegara ao fundo do bolso.
Um deserto
Sem credo
Nem cravo,
Onde outra lágrima,
Ainda flácida
Do último desgosto,
Evaporava.
Política senhora sem rosto,
Puramente acida,
Oleosa,
Covardemente áspera,
E zelosa
De um jeito danoso.
A mão que rouba
E não dá em nada
É a mesma que serviu sopa,
De graça,
Para velar promessas falsas.
São as novas remessas desviadas
Entre pedras, vidraças, CPIs inacabadas
E câmaras públicas superfaturadas.
São os novos contratos reda
E as velhas obras empreitadas.
É o larápio pego no flagra
Que sempre escapa da cela.
Veja o dono do castelo:
A casa do paloso caiu
E ele escapuliu ileso,
Tinha a imunidade Brasil.
Lá na banca do Congresso
Entre verbas, águias
E seções vazias,
Entre os recessos
E as histórias mal contadas,
A ordem perde o progresso,
O lobista recebe a mesada,
Veste um novo terno
E dá um nó na gravata.
Na nossa garganta
Uma coorporativa Pátria
Fica entalada,
Esperando o “tapinha” nas costas
Nas eleições próximas.
O futuro é temeroso,
Sem razões nem anseios,
É quase um grito sigiloso,
Antigo, nas mãos do meio.
Sem reforços,
Engatilhado, cheirado,
Tímido, silencioso,
Um pobre segredo leigo,
Íntimo do ócio penoso.
O menino iletrado,
Sem merenda nem recreio,
Tomba em mais um desfecho moço.
Recebe tiro no meio dos desejos.
Sem alma, dor ou medo nos bolsos,
Será mais um corpo morto,
Matando, aos poucos,
Um novo Governo
Que chegou ao fundo do bolso.

quarta-feira, 11 de março de 2009

O dia em que a Igreja Católica violentou a inteligência

Bento XVI que me perdoe o título paloso e o trocadilho inevitável, mas diante dos últimos acontecimentos, esse texto não poderia ter pontífices na língua.

O bispo católico excomungou o médico e, praticamente, benzeu o estuprador! Tudo bem, até aqui novidade nenhuma. Violentar criancinhas não é pecado para certos sacerdotes. Só não pode usar camisinha.

Usar camisinha é um pecado perigoso. Quase uma heresia. A Igreja prega que essa bendita borracha, criada para salvar vidas, é uma lâmina afiada que a ciência criou para decapitar as providências divinas.

Pro sujeito não pegar AIDS e outras doenças sexualmente transmissíveis, tem que ter é muita fé. Pagar o dízimo direitinho, freqüentar a missa, se confessar sempre e assim por diante. Mas, se estiver escrito irmão, não tem jeito! Como diria o Cazuza serás uma cobaia de Deus.

No final das contas, o médico pernambucano que, apenas exerceu dignamente o seu ofício, salvando a vida de uma criança de 9 anos - covardemente estuprada pelo padrasto, sem camisinha-, acabou tendo foi sorte. No tempo da Santa Inquisição estaria literalmente frito.

A gente se assusta com depoimentos como o do Bispo, mas a verdade é que sempre foi assim. A Lei de DEUS, que também foi escrita pelos homens, excomunga, há séculos, a ciência.

O táctil, o palpável, o provável, sempre ameaçou os domínios do lúdico. Os seguidores da ciência sempre foram ameaça ao reinado da fé católica. Eu mesmo, até começar a tirar minhas próprias conclusões das coisas, fui uma vítima desta condenação.

E juro aqui de pés juntos (mesmo sabendo que jurar também pode ser um pecado): sempre procurei respeitar o divino. Claro, mais por temor a Deus que por fé.

Eu temia, por exemplo, que, num deslize infantil, no jejum das sete e pouca de uma linda manhã ensolarada, mastigasse, sem querer, o corpo de Cristo ali, em plena missa matinal de domingo. Seria uma tragédia.

Já pensou? “A hóstia é sagrada, crianças”. Pelo menos, foi o que a “pró” de religião sempre disse. “A hóstia tem que dissolver na ponta da língua e, enquanto ela dissolve, em silêncio, você pede perdão pelos seus pecados, não pode mastigar, hein!”.

Minha mãe ainda guarda aquela foto minha ridícula, clichê, com a vela na mão e a cara de santo. Quem fez primeira comunhão tem. E deve ter também lá dentro da lembrança a primeira confissão. Eu lembro bem da minha.

Por ironia do destino, o padre só conseguia me enxergar pela obra e graça da ciência, com seus óculos tipo fundo de garrafa, armação pesada, quase marfim, mas amarronzada.

Olhos miúdos e pontiagudos, quase inquisitórios, apertando-se para me enxergar dentro da alma. Eu, uma pobre criança de apenas 9 anos de idade ali, sufocado entre a minha ignorância e o olhar sentencioso de um padre, armado até os dentes com terços e pai nossos.

O que dizer? O que contar àquela criatura sombria, sisuda, assexuada, vestido para matar minha liberdade de pensar? Eu disse pouco, claro, economizei pecados para a próxima confissão que, graças a DEUS, nunca mais aconteceu.

Até poder dimensionar o significado da palavra pecado em minha cabeça, sofri o pão que a Igreja amassou. Carreguei durante anos a culpa católica na cabeça. Uma violência contra qualquer criança que está descobrindo o mundo.

Ai, um belo dia, resolvi mastigar a bendita hóstia. Só pra saber, mesmo. No início tive medo. O que será que Deus reservava para mim? Qual seria o meu castigo diante daquele absurdo? Será que ele tinha percebido que eu mastigara a hóstia sagrada?

Pelo jeito não. Depois daquele fatídico dia, comecei a crescer sem freqüentar a missa, os dogmas e as mentiras católicas. Quando mastiguei aquela hóstia, ganhei minha liberdade de pensar, comer, beber, cheirar, sentir e viver as maravilhas do mundo, que os católicos afirmam ser obra de Deus.

Eu acredito em Deus, mas do meu jeito. E sei também que a minha dúvida infantil ainda é a dúvida de muitas crianças que cresceram se arrependendo dos seus pecados e carregando culpas pesadas.

As crianças que não mastigaram a hóstia, provavelmente, estão hoje entre os milhões de brasileiros indignados com a violência cometida por um padre em rede nacional.

Quando o padre excomungou o médico, acabou confessando, em público, o maior pecado da Igreja: o menosprezo pela inteligência humana.

sexta-feira, 6 de fevereiro de 2009

O Banco Denorex e a Lei dos 15 minutos

Salvador, sexta-feira, 30 de janeiro, 13h 45 min. O ano é o corrente e a minha conta é com o Leão. Para honra-la escolhi a agência do meu banco, que fica no Shopping Barra. A fila terminava no último degrau da escada. Média de uma hora e meia para eu conseguir chegar à boca do caixa.

Na parede, sobre os idosos, sentados à minha direita, a Lei dos 15 minutos, impressa. Na minha testa, provavelmente, a palavra otário, porque eu jamais poderia provar que fiquei mais de 15 minutos naquela fila. O meu banco não disponibiliza senha para mim.

15 minutos de bocejos de espera depois, sem a fila dar um passo, uma senhora inicia um motim lá na boca do caixa. A fila ganha voz e ela começa a berrar e bater no balcão: “quero ser atendida! Quero ser atendida!...”, eu também queria. Eu e a torcida do Bahia. Mas continuávamos ali, juntos esperando Pituaçu chegar.

Ela alegava que o caixa do meu banco, que também era o banco dela, estaria dando preferência a fura filas. Coisas do Brasil. Vícios irremediáveis, ou melhor, malandragem incurável, visceral. O Brasil é dos espertos. O meu banco também é.

Mas voltemos à fila. Outra senhora apóia a líder da fila de cá e mais uma boca berra ali, outra acolá, um caixa pára em protesto, o outro segue o companheiro, vira movimento sindical, o gerente aparece e eu desapareço dali. Desisto daquela agência do banco que é todo meu e agora, de mais alguns milhões de servidores públicos que eram clientes do Bradesco.

Parto a milhão. Rumo até a agência do meu banco que fica no bairro da Graça. Era meu último dia para fazer o Leão sorrir. E aquela conta só poderia ser paga no meu banco. Uma pena. Dessa vez, a fila terminava na porta giratória e eu ainda era o último colocado. Eram 14h 23 min quando cheguei.

A Lei dos 15 minutos também estava lá, impressa, disfarçada entre uma persiana e a janela. E às 16h eu fui finalmente atendido. Honrei minha dívida com e Leão, já quase mordendo a própria orelha, porque o meu banco, mais uma vez, em mais um dia de pagamento dos seus novos donos, me fizera perder uma tarde inteira.

Mais uma vez, o meu banco colocara apenas 4 caixas atendendo uma fila enorme. Um deles só dos idosos. Mais uma vez, eu me senti enganado pelo banco que diz na mídia que é meu, da Maria, do João, seu e da torcida do seu time. O Banco Denorex. Aquele que parece nosso, mas não é.

Como a Lei dos 15 minutos, que parece Lei, mas não é, porque não funciona para todos os bancos. Apenas para aqueles que se comportam como empresas de verdade e nos tratam como clientes de verdade. Não é o meu banco.

palosas

Pronto. Estou aqui. Resolvi jogar na rede o que me incomoda, assola, alegra, consola, conduz, ou, simplesmente o que sempre me reduziu a um nó na garganta.
Decidi opinar sobre o que me der nos tetos, mas, sobretudo, aquilo que me enxágua os olhos e resseca as esperanças. Espantarei aqui o que me estanca, incendeia e amansa. O que tem e o que não tem nexo.
Escreverei sobre as palas do meu dia a dia. Minhas percepções. Não sei por que ou até quando. Não sei de quando em quando ou de que formas. Só sei que ainda é começo. Garoa. Aurora. E pode ser sem rima também. Em prosas palosas, do meio ao fim.
E embora começar assuste, digo que o silêncio é um templo de sabedoria e, como o peso gorduroso desta frase, ele logo fica gritante. Deixar-me continuar amanhecendo com o silêncio calado em mim seria paloso.
Com o tempo, ficar quieto na insônia morosa das horas deixa de ser cômodo e passa a ser pala mesmo. Perecer longos anos a sós com as idéias e fetiches verbais é péssimo para as palavras. Entope as gavetas e pode entupir as veias, de tanto tédio. Ego no xadrez.
Escrever um blog para aparecer é paloso. Por achar que pode ser uma forma de economizar com analista, também. Eu bem que queria o meu plano de saúde cobrindo uma análise para mim. Pouco provável. Só me restou tentar aparecer.
E também não precisamos ir longe para concluir que a análise é uma grande bobagem, diante de milhões de outros brasileiros que não têm direito sequer a um simples atendimento na saúde. Morrer nas filas do SUS é paloso. E isso sempre sai nos noticiários varonis.
Ser paloso é ser notório, notícia, noticioso, reincidente, renitente, injusto, teimoso, irritante. É ser governo, oposição, lobista, até ser publicitário é paloso hoje em dia. Alguns não estão nem mais tão carecas de saber.
O ser paloso é um copo cheio até a boca de contradições. Uma metamorfose ambulante, repleta de dúvidas e suposições. O paloso é repetitivo. Maravilhado ou maravilhoso demais. Deve ter lá suas razões. Ser paloso é humano.
Aliás, ser paloso é não conseguir se comunicar em Salvador, por exemplo, sem dizer “lá ele” (pra quem não é baiano, o tal do “lá ele” é a defesa contra os verbos pervertidos). Eu me incluo nessa pala.
Dar um fora é ser paloso. Tomar um fora também. O alegre demais é paloso. A comédia forçada, com caras e bocas exageradas é palosa. Para mim, pessoalmente, transformar Piaba em Piada é paloso.
Uma tragédia anunciada, também. A chuva que ninguém esperava. Famílias inteiras soterradas no sul. O Brasil doendo-se e doando-se. Os donativos sendo saqueados voluntariamente. Um galpão cheio de outras roupas doadas, incendiado criminosamente. Isso tudo é paloso. E ninguém esperava também.
O Brasil é paloso. As cabeças, barrigas e cabaças vazias na sede do semi-árido já são “palas” perdidas no tempo. Desde que me entendo por gente a seca mata esperanças, bichos e a nossa igualha. É do solo infértil da seca que nascem discursos, radialistas e coronéis. Política palosa. Óbvia.
A maior prova disso está ai: a pala da transposição do São Francisco. Tenha ou não conseqüências para o meio ambiente; seja ou não para a massa ser manobrada politicamente e as boas intenções serem desviadas de curso, lá na frente, a transposição é palosa. E pior, para ontem.
O que a gente faz contra o meio ambiente é paloso. Mudar, desviar, destruir as fontes e reservas naturais, indiscriminada e impunemente é uma burrice artificial.
E ser um burro artificial, sem sentimento para alimentar as atitudes, também é ser um paloso. É atirar no pé e machucar seriamente as futuras gerações.
No Brasil, a pena ambiental não faz nem faísca diante das queimadas na Amazônia. Elas diminuíram agora em 80%, mas os números de qualquer governo sempre são questionáveis. Deve ter um over Ming ai.
Mas o pior de tudo é que, mesmo devendo no cartório, o mundo nos julga. É realmente paloso ser maldito lá fora. O governo não consegue conter brasileiros que não evoluíram e o MSF (Movimento dos Sem Florestas) invade o território nacional pelo Norte.
Bom exemplo é Roraima. A mídia põe as lentes nos crimes de pedofilia, na Raposa Serra do Sol, os índios acreditam serem donos de boa parte do território de Roraima e os estrangeiros abastados compram fazendas por lá. Só não vê quem não quer. O loteamento do Brasil é paloso.
A seca, a cheia e tudo que deriva do nosso desrespeito ambiental, pra mim é paloso. A morte do seringueiro Chico na porta de casa e da missionária Dóris, com sete tiros, são palas tristes.
A frase do homem do povo que, ao enterrar a missionária Dóris comparou-a a uma semente importante é palosa de boa. Para mim, profundamente emocionante e verdadeira.
Os mensaleiros impunes, a malandragem de eras, politicamente correta, glorificada nos morros e nos asfaltos do Brasil inteiro é uma pala da porra.
No Brasil, da classe A à classe E, o bom é ser esperto, furar fila, fazer malandragem. Aliás, como diz um samba muito bom que Zeca Pagodinho canta: “malandro é malandro e mane é mane”.
E vivendo no reino da malandragem, dos fura filas e das gerações que desaprenderam a respeitar os mais velhos - matando-os hoje a socos, ofensas e ponta pés-, o sujeito precisa ser paloso.
Ainda mais que a impunidade sempre acaba finalizando o nosso bom senso. A Lei brasileira é branda e passiva, como nós brasileiros somos. Aqui se o sujeito tem dinheiro de advogado e é réu primário vira rei.
Eu costumo respeitar as leis e os mais velhos. Se não fossem os meus pais, eu não estaria aqui. Os seus cabelos brancos são as minhas raízes. E eu acho definitivamente paloso desrespeitá-los.
Mas, mais paloso ainda é tentar entender um pouco da história do Brasil. Pelo pouco que aprendi sobre a nossa verdadeira história, a maioria de nós quase nunca brigou por nada, porque a minoria dizia estar brigando pela maioria de nós.
Uma lógica perversa e burra. É de onde vem a nossa comodidade. Por exemplo. Oficialmente, o Tiradentes é o herói da Inconfidência Mineira. Pelo menos, é o que nos ensinam ainda no primeiro grau da escola.
Quando chegamos ao segundo grau, a casa cai. Dizem que não era bem assim, que ele era coadjuvante. E que a tal da Inconfidência Mineira seriam, na verdade, confidências ideológicas.
O nosso herói do primeiro grau era um simples observador. E de tanto espiar, mineiramente, os poetas e intelectuais - iluminados pelo velho mundo-, conspirando e planejando revoluções ali, ele virou bode expiatório.
Quando a casa de Tiradentes caiu em minha cabeça, achei paloso sentir-me tão covardemente enganado.
A Lei Áurea é outra pala. Uma decisão minoritária, que deixou a maioria dos escravos acorrentada à Casa Grande e à Senzala. E assim, com a maioria de nós preterida, crescendo e reproduzindo-se desordenadamente nos grandes centros, chegamos até aqui.
Caiu a Colônia, o Império, a República e, graças à nova ordem mundial, a nossa Ditadura também caiu. A democracia foi uma luta bonita, mas uma luta mais burguesa.
Eu acredito que o povo não se engajou. No interior tinham medo dos comunistas comedores de criancinha. E isso é covardemente paloso. Nossa redemocratização seguiu os trilhos da nova ordem mundial, mas a ditadura deixou seus filhotes, métodos e cicatrizes políticas.
E enquanto países mais desenvolvidos seguem desenvolvendo sua gente, tratando-os como motores e instrumentos de seu próprio desenvolvimento, nosso povo continua sendo visto e tratado como instrumentos de reposição de mandatos e reeleições. Paloso.
É paloso ver as periferias inchando. Sentir a pobreza e a violência cada vez mais próximas de nós, em Salvador e em outras grandes capitais é paloso.
Apenas por estes motivos resolvi escrever palas na internet. Sem me estender tanto, claro. Escrever muito também é paloso, hoje em dia.